quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Subliminar

























O alerta vermelho soou quando, no início do ano, por ocasião da apresentação dos resultados obtidos pelo Grupo VW em 2009, o Sr. Martin Winterkorn – presidente do império VAG - manifestou publicamente a sua preocupação com a quebra de lucros da Skoda Auto. Relembre-se que 2009 fora um ano particularmente negro para o sector automóvel e que, nesse cenário traumático, a Skoda ousara, não só bater o seu próprio recorde de unidades vendidas em 104 anos de produção automóvel, como também conseguira aguentar a empresa nos lucros. Um feito notável num cenário devastador, sobretudo sabendo-se que a valorização crescente da coroa checa face ao euro acabara por ser uma dificuldade adicional para o construtor de Mladá Boleslav, não sentida, por razões óbvias, pelas restantes marcas do Grupo. Quando uma esmagadora maioria dos construtores automóveis de todo o mundo daria tudo por ter obtido resultados tão promissores quanto a Skoda em 2009, a preocupação do Sr. Winterkorn – que, refira-se, é lícita numa perspectiva de médio prazo – não soou nada bem, sobretudo por ter sido proferida para a imprensa quase em jeito de crítica, em vez de ser abordada em sede própria – ou seja, em reuniões internas com a Direcção do construtor. Nessa altura, muita gente jura ter 'ouvido' o seco som de uma pistola a esfacelar o pé do Sr. Martin.

Algumas semanas mais tarde, murmúrios cibernáuticos começaram a ventilar uma presumível saída do Sr. Reinhard Jung da presidência da Skoda Auto, uma possibilidade que rapidamente se consubstanciou numa notícia oficial, a tomar efeito a partir do dia 1 de Setembro. Razões evocadas – a reforma do Sr. Jung - cuja idade, curiosamente, não ultrapassa os 59 anos. Daí a poder ler-se na imprensa especializada que o afastamento do Sr. Jung se devia ao facto da Skoda ter enveredado por uma via qualitativa demasiado elevada face aos padrões desejados pela VW e pela Audi, foi um passo. Uma notícia espalhada aos 4 ventos que, curiosamente [ou talvez não] nunca foi oficialmente desmentida. E numa catadupa de acontecimentos infelizes, o Sr. Martin terá mesmo chegado a deixar transparecer que ficara furioso quando uma das mais prestigiadas publicações alemãs editara um comparativo no qual o Skoda Superb vencera inequivocamente o Volkswagen Passat. Partindo do princípio que o Sr. Winterkorn é um homem muitíssimo bem informado, isto não terá sido propriamente uma novidade, já que a frequência com que a Skoda vai batendo os seus mais diversos rivais na imprensa especializada, incluindo naturalmente os seus companheiros de Grupo, é absolutamente digna de registo. Se necessário, o semlimites faz uma súmula.

De então para cá, têm-se multiplicado ecos de afirmações erráticas proferidas pelo Sr. Winterkorn na imprensa alemã, a propósito da Skoda, as quais culminaram com uma declaração muito infeliz, divulgada no passado dia 2 de Setembro pela AutoBild: «Vamos ter que manter a rédea curta à Skoda. Eu não lhes invejo o sucesso, mas não nos podemos enfraquecer a nós mesmos». [NDR: declaração traduzida com o auxílio das ferramentas do Google]. Claro que se poderá alegar sempre que estas frases foram retiradas do seu contexto original, o qual, infelizmente, não conhecemos na íntegra [apenas tivemos acesso a uma parte do mesmo]. Ainda assim, há nestas declarações demasiada força de palavras para que as mesmas não possam ser devidamente analisadas, independentemente daquele que seja o seu enquadramento. Comecemos pela semântica do Sr. Martin - fica muita coisa dita quando um Presidente de um Grupo industrial poderosíssimo se refere a uma das suas principais empresas na 3ª pessoa do plural, para defender, na mesma frase, uma parte desse mesmo Grupo - desta feita, na primeira pessoa. «Eles» e «nós»... Por outro lado regista-se uma incongruência marcante, já que as dramáticas preocupações registadas em declarações anteriores se consubstanciaram, de repente, em «sucesso». Um «sucesso» do qual se diz não ter inveja, mas que, para proteccionismo de outras empresas que não ousaram crescer com igual pujança, será prudentemente mantido sob «rédea curta»... Muito mais poderá ser dito sobre estas palavras, mas deixamos essas análises e considerações para os nossos leitores.

Dito isto, há razões para preocupações sérias? Não.
- Primeiro: Neste momento a Skoda está a concentrar-se na consolidação dos mercados da China, da Rússia e da Índia, onde o seu crescimento tem sido exponencial, fortalecendo ainda a sua quota na Europa Ocidental e Central, sem descurar, naturalmente, uma maior penetração em África, na América do Sul e na Oceania. A tónica a curto prazo irá para novos modelos de entrada, com o citadino e o sucessor do Octavia Tour a entrarem no mercado com preços muito agressivos, complementando uma gama muito competente, transversal a múltiplos sectores do mercado e que, com estas novas 'ferramentas', ganha argumentos reforçados para capitalizar novos clientes. Sobre a alegada diferenciação tecnológica da Skoda face à VW e à Audi, defendida pelo Sr. Winterkorn, também não há nada a temer. Um exemplo: recentemente o Sr. Christian Buhlmann, responsável pela Comunicação da Volkswagen nos EUA, referiu à «AutoCar» o caso exemplar do Superb que, estando tecnologicamente mais próximo de um Golf do que de um Passat, enfrenta, com sucesso, o mesmo segmento de mercado deste último. Ou seja, não foi pelo facto de ter partido de uma base tecnológica teoricamente inferior que a Skoda deixou de construir um automóvel que é manifestamente superior àquele outro. Antes pelo contrário - os testes comprovam-no. E foi esta feliz opção que permitiu garantir valores de aquisição do produto final imbatíveis – uma fórmula vencedora que, muito provavelmente, veremos aplicada em futuros modelos da marca, nomeadamente na próxima geração do Fabia.

- Segundo: Sendo o Sr. Martin Winterkorn uma pessoa extremamente inteligente, certamente que tudo isto terá uma explicação muito bem fundamentada tendo exclusivamente em vista os altos interesses da marca e do Grupo. Mesmo que a mensagem passada até agora à opinião pública seja completamente subliminar para a esmagadora maioria dos comuns dos mortais. Se assim não fosse, isto é, se tudo isto não passasse de um deplorável ataque a uma das mais bem sucedidas marcas do Grupo VAG, seria quase certo que na altura em que forem publicados futuros comparativos de próximas gerações de Skodas a vencer Audis e Volkswagens, a cadeira onde o Sr. Martin os iria ler teria um conforto bem diferente daquela onde hoje se senta diariamente, no seu escritório em Wolsburgo. Já para não falar no fortíssimo amargo de boca que então sentiria. É que o núcleo duro do império VAG já deu provas anteriores de que há coisas que não se perdoam, fazendo bom uso de... «rédea curta». Tudo a bem do «sucesso», naturalmente.

[foto: Life]

2 comentários:

joão franco disse...

Vai a skoda ser descartada do grupo vw?
não creio, 1º porque o dono do grupo, herr Piesh, foi o grande impulsionador da skoda; 2º porque a colaboração já existia muito antes do fim da cortina de ferro.
Espero que o bom senso volte a imperar, agora que das três marcas oriundas dos países da neve,Saab, Volvo e skoda só esta ultima está florescente... a menos que o capital da skoda venha a ser «apimentado» por um qualquer molho de caril.

semlimites disse...

João, fique descansado que a Skoda não será descartada do Grupo. Antes pelo contrário: a marca tornou-se demasiado importante para a prossecução dos objectivos do Império VAG. O que vai acontecer é que a par do inevitável crescimento do construtor de Mladá Boleslav, será ganha uma cada vez maior influência junto do núcleo duro de Wolsburgo. E, assim sendo, a estratégia de médio-longo prazo terá, cada vez mais, o cunho de Mladá Boleslav, independentemente dos desabafos infelizes do Sr. Martin.

Como diz, e bem, o Sr. Ferdinand Peich, que é quem no fundo 'puxa os cordelinhos' em Wolsburgo, sempre teve um papel fundamental no pujante rumo dado à casa da Seta Alada, não estando certamente disponível para determinado tipo de brincadeiras.

Por outro lado, Winfried Vahland - o novo Presidente da marca -, já fez saber que o futuro da Skoda é para ser projectado em grande. E diz-se que a influência deste homem é tal que há já quem o aponte com um dos 4 'elegíveis' para suceder ao Sr. Winterkorn na Direcção do Grupo, mesmo que para já a substituição deste último ainda não esteja a ser equacionada.

Obrigado pela sua participação. Saudações Skodistas, semlimites