Lisboa, 18 de Janeiro de 2008. A noite foi-se derramando preguiçosamente sobre a cidade, arrastando consigo uma massa de ar saturada de humidade, pesada e soturna. Lentamente, foi-se desenhando um cenário propício ao desenrolar dos mais misteriosos acontecimentos, mais próxima de uma tela de cinema, do que de uma aparentemente pacata noite de 6ª feira.
Uma Fabia Combi negra rasga a densa bruma que se abateu sobre a cidade, rolando suavemente em direcção a poente. Ao acender distante de mais um semáforo vermelho, a carrinha vai lentamente perdendo velocidade, até por fim se imobilizar junto ao sinal.
No interior do automóvel tenta-se vislumbrar pelas janelas os contornos esfumados do que resta de uma metrópole envolta em nevoeiro. - Ah! Uma Fabia Combi das novas! Não 2, espera… uma frota de Skodas espalhada pela Praça das Indústrias!
Um outdoor na fachada do edifício da antiga FIL denuncia um reclame da nova carrinha da Seta Alada. Há bandeiras da Skoda a esgrimir movimentos contra a neblina cerrada, ao mesmo tempo que dois projectores de uma luz branca lancinante vergam a densidade do ar húmido que se aninhou à beira rio, encandeando os contornos voluptuosos de 2 Fabias Combi, candidamente desnudadas aos olhos de uma cidade ofuscada por densos nevoeiros.
O semáforo ficou verde. A Fabia negra arranca lentamente vencendo de novo a bruma. O movimento suave da carroçaria faz-se contra a vontade dos seus perplexos passageiros. Um evento da maior magnitude, com a expressa assinatura da Seta Alada, estava a desenrolar-se nas suas próprias barbas sem que sobre o mesmo tivessem ouvido o mais pequeno dos rumores, sem terem a menor das suspeitas à cerca da sua existência…
As horas passaram-se. É quase meia-noite e a cidade metamorfoseou-se. O nevoeiro desaparecera de súbito, dando lugar a uma atmosfera muito mais seca e limpa, aclarando-se agora os contornos da urbe com uma acutilante definição. A Fabia preta rola de novo rumo à Praça das Indústrias, para desvendar os mistérios cujas pistas se perderam pela incessante rotina de um semáforo. Só que agora o local parece ter sido vítima de uma limpeza laboratorial: do edílico cenário de um terreiro aberto ao Tejo coroado de Skodas, restam agora 3 fileiras de elegantes bandeiras a esvoaçar Setas Aladas sobre uma cidade meio adormecida, ao mesmo tempo que o vistoso anúncio pendurado à frente da fachada da FIL descansa agora tranquilo, depois do desligar das luzes da ribalta. Sente-se um amargo de boca…
Há ainda tempo para uma infrutífera busca na net. Resta a esperança de que com o rasgar de um novo dia, se repita tudo de novo. No dia seguinte, nova passagem pela Praça das Indústrias e novo cenário impregnado de aridez. Entretanto, o outdoor também desaparecera. Ficaram as bandeiras para provar que não fora o nevoeiro maciço o responsável por um misterioso sonho coroado de Setas Aladas. Um sonho bom demais para ser verdade, mas que o foi. Um duro pesadelo, por nos ter passado mesmo ao lado, sem o podermos ter vivido.
[foto: João]
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